A sala de exposições temporárias do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian vai ser ocupada até 27 de Abril com o mais recente trabalho do fotógrafo Daniel Blaufuks - Collected Short Stories. A proposta é sugerir uma história com duas imagens.

Collected Short Stories é constituída por um conjunto de dípticos construídos com imagens obtidas em diferentes lugares (Lisboa, Berlim, Nova Iorque...). Estas imagens estão associadas a um vídeo, que é projectado no tecto e pode ser visionado a partir de um escadote, o que permite simultaneamente observar a exposição de um ponto de vista mais unificado.

Segundo a nota de imprensa, nas pequenas histórias que Blaufuks sugere «o âmbito potencial é dado pela relação que se estabelece entre a primeira e a segunda imagem a partir de: espaço e personagem, interior e exterior na cidade, tecido e corpo, escuro e iluminação artificial».

Os títulos das fotografias funcionam como legendas das próprias. Em vez de uma interpretação explícita, o fotógrafo remete o público para um quadro de infinitas possibilidades, sendo que a primeira imagem mais não é do que um convite ao visitante para outras imagens, histórias ou emoções.

Na construção dos dípticos, conforme que se pode perceber no livro ou no site de Daniel Blaufuks, a ideia chave é a de contiguidade ou de vizinhança, que pode ser construída apenas pelo título &endash; que unifica a dupla de imagens e abre o intervalo para a sua relação. Os títulos sugerem-nos mesmo a ideia literária: histórias de cidades, de viagens, de errância, que se tornam evidentes pela diversidade de paisagens e personagens representadas.

O artista tem por suporte privilegiado a fotografia, a cuja apresentação acrescenta por vezes um filme, um livro (escrito como uma espécie de diário) ou uma instalação, estabelecendo em alguns casos uma relação com a literatura. Aparentemente, tudo indica que Blaufuks caminha no sentido da "literalidade" da fotografia. A relação ambígua da imagem e da narrativa de antigos trabalhos surge agora como decidida e, ao mesmo tempo, decisiva. A ideia de instalação é também evocada na exposição, com as paredes pintadas de vermelho-ocre.

A par da mostra, é lançado um livro homónimo da exposição que se assume como uma espécie de diário de bordo. Em 14 anos, Daniel Blaufuks criou 13 livros/catálogos.

Numa entrevista ao jornal Público (Dezembro de 2002), o fotógrafo definiu-se de uma forma curiosa: «nas palavras de Mário de Sá Carneiro sou "um fixador de instantes". Nas de Teixeira Gomes serei, talvez, "um caçador de mariposas". Mas, de facto, não sei...». Daniel Blaufuks nasceu em Lisboa, em 1963, e é considerado um dos mais prestigiados fotógrafos do Portugal contemporâneo. Filho de mãe alemã e pai polaco, ambos de descendência judia, Blaufuks regressou a Portugal aos dezoito anos, depois de uma estadia de seis anos na Alemanha. Em 1987, iniciou estudos no Centro de Arte e Comunicação Visual (Ar.Co), em Lisboa e prosseguiu-os depois, já na década de 90, no Royal College of Art, em Londres, e no Watermill Center, em Nova Iorque. Em 1989 recebeu o Prémio Kodak e começou a expor regularmente. A sua primeira mostra individual foi "Para Mais Tarde Recordar" e consistiu em cerca de 20 fotografias, a preto e branco instaladas em caixas de luz, obtidas em lugares tão diferentes como Bolonha, Veneza ou Aveiro. O seu trabalho é marcado desde o início por uma interligação com a sua experiência de vida, nomeadamente as viagens, a sua própria vivência e as suas leituras. Daniel Blaufuks privilegia a fotografia enquanto objecto central da pulsão da visão, e reflecte sobre a centralidade desta pulsão na nossa cultura. A cor e a polaróide são as principais características do seu trabalho, ainda que o preto e branco não seja colocado de parte. O ponto de partida é sempre o mesmo: trabalhar a partir da imagem.

A semelhança com a literatura de viagens é a grande especificidade do fotógrafo. As viagens são uma constante no quotidiano de Blaufuks, que se mostra precisamente como um viajante. A este propósito, algures no site da NON!, lê-se qualquer coisa como: «terá na bagagem livros de Walt Whitman e de Pessoa, uma máquina fotográfica e um caderno, onde anota as suas ideias e cola as suas imagens». Neste sentido, e como é referido no site Artlink, «a fotografia está indissociavelmente ligada à ideia de morte e de tempo», pelo que «o seu trabalho envolve uma componente ontológica e existencialista, de reflexão sobre a condição mortal do ser humano, constantemente negada através das imagens».

A inauguração de Collected Short Stories vai decorrer no dia 27 de Fevereiro, pelas 22 horas, no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, onde vai ficar patente até 27 de Abril. A mostra pode ser vista às terças das 14h00 às 18h00 e de quarta a domingo das 10h00 às 18h00. Viagem é o tema e o ponto de partida do trabalho, que suscita a uma reflexão do conceito de desterritorialização.

 

Inês Amaral (aeiou)